Na cidade de Cotia (SP) no ano passado só se falava nisso. E no TRT de São Paulo, depois do recesso deste ano, também. Na defesa, a reclamada sustentando que a reclamante fora dispensada por fazer sistematicamente “barulhos imotivados".
Durante a instrução, a juíza surpreendeu-se com a constatação do verdadeiro motivo determinante da demissão: "motivo de flatulência, que nem sempre é controlável". A magistrada chegou a admitir que "embora extremamente constrangedor, qualquer pessoa, em qualquer local, está sujeita a ter um problema semelhante". Por isso, condenou a reclamada ao pagamento de todos os direitos trabalhistas. Em síntese: reconheceu a injusta causa da demissão, ao admitir a causa justa na necessidade de expelição de gases.
Foi no âmbito do tribunal paulista que as petições vieram enriquecidas com explicações sobre os gases humanos. A versão da reclamante era a de que eles são "notoriamente incontroláveis". A da empresa, de que "eles causam constrangimentos, não só entre os colegas, como também ante os clientes que chegam".
Mas o ponto alto da controvérsia jurídica veio com a erudição e os conhecimentos fisiológicos apresentados pelo acórdão da 4ª Turma: "trata-se de reação orgânica natural à ingestão de alimentos e ar, os quais, combinados com outros elementos presentes no corpo humano, resultam em gases que se acumulam no tubo digestivo, que o organismo necessita expelir, via oral ou anal".
O revisor foi convicto: "estrepitosos ou sutis, os flatos nem sempre são indulgentes com as nossas pobres convenções sociais".
E o vogal lembrou que "disparos históricos têm esfumaçado as mais ilustres biografias. Por exemplo, Jô Soares já relatou a comprometedora ventosidade de D. Pedro II".
E, afinal, o colegiado fechou num ponto: “a imposição dolosa, aos circunstantes, dos ardores da flora intestinal, pode configurar, no limite, incontinência de conduta, passível de punição pelo empregador, mas a eliminação involuntária, conquanto possa gerar constrangimentos e, até mesmo, piadas e brincadeiras, não há de ter reflexo para a vida contratual".
Por isso, o TRT-2 reconhecendo que "a empregada não agia de má-fé", concluiu que "resta insubsistente, por injusta e abusiva, a advertência pespegada, e bem assim, a justa causa que lhe sobreveio".
A contenda ainda seguirá, mais algumas semanas, seu périplo nos escaninhos e salas do TRT. Ali, a empresa, na semana passada, interpôs embargos de declaração. Há quem diga que o objetivo do recurso seria obter um pronunciamento judicial sobre qual é o volume de gases tolerável num ambiente de trabalho. Mas o certo é que a contenda já é conhecida no tribunal paulista como o "processo do perfume francês"...
Há especulações de que, quando chegar a Brasília, será batizado de "savoir faire". [...]
Se alguém me contasse não acreditaria.
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