“Chico, devolve o Jabuti"

Fiz questão de assinar.  Leiam...

Olhem, teve início a campanha cívica “Chico, devolve o Jabuti”. Há uma petição na Internet. Para assinar, clique aqui. Não fui eu que comecei, não. Sou a terceira assinatura. Aliás, peço a quem o fez que corrija o nome do livro de Edney Silvestre. O correto é “Se Eu Fechar Os Olhos Agora” — está faltando o “agora” lá. Somos todos contra a apropriação indébita, certo? A gente não é do MSJ — o Movimento dos Sem-Jabuti. Isso quer dizer que a gente não acredita, como João Pedro Stedile, que cada um tem de ter o seu Jabuti. Nããão! A gente só reivindica que ele seja realmente conferido ao vencedor.

Reivindicar que a vitória seja do vencedor não é, assim, algo tão excepcional, é?

Assine a petição!

Chico, devolve logo esse jabuti, rapaz!

Para assinar e divulgar a petição, clique aqui.


Querem que eu fale a sério sobre o Jabuti do sambista Chico Buarque? Pois não! Então vamos lá!

Às 7h41 de ontem, publiquei um post com o link para uma petição pública intitulada “Chico, devolve o Jabuti“. Não foi iniciativa minha, não. Tanto é que pedi para o autor corrigir o título do excelente livro de Edney Silvestre, que ficou em primeiro lugar na categoria “romance”. O certo é “Se Eu Fechar os Olhos Agora” (está faltando a palavra “agora” na petição. “Leite Derramado”, de Chico Buarque, ficou em segundo. Sei… Se Lula derramar o seu leite numa autobiografia, também levará o prêmio de “Melhor Livro de Não Ficção”, embora devesse vencer o de “Melhor Pior Ficção”. Não sei se estou sendo claro…

Quando publiquei o post, havia apenas dois outros signatários; eu era o terceiro. Menos de 24 horas depois, já são 2.418. Confesso que o fiz, como diria Machado de Assis, movido por um tanto de melancolia (o que tem de bocó no país é um escândalo!) e outro tanto de galhofa. A reação petralha, no entanto, foi tão violenta que, agora, digo com a seriedade possível quando se trata do binômio sambista-literatura: “Chico, devolve o Jabuti”. A Câmara Brasileira do Livro, que confere a láurea, não é estatal, mas tem, como entidade sem fins lucrativos, reconhecida pelas editoras do país, um caráter público. E não pode, por isso mesmo, orientar-se por critérios ideológicos ou político-partidários. Mas está, como quase tudo, contaminada pela idéia de “justiça social” — ou melhor, foi seqüestrada pelos coronéis monopolistas da justiça social — , ainda que pratique “injustiça literária”. Seria o mesmo que uma entidade voltada para o aprimoramento da medicina ocupar-se mais de política do que de saúde, entenderam? Então agora eu realmente convido o sambista a devolver o que não lhe pertence. O endereço da petição está aqui. Assinem. Espalhem. Levem para as chamadas redes sociais. “Chico, devolve o Jabuti”.

E ele tem de devolver porque não venceu. Logo darei um exemplo ao gosto da platéia de Lula porque os petralhas resistem em tirar as duas mãos do chão para ver se o cérebro, beneficiado pela postura vertical, consegue fazer algumas sinapses que ao menos remetam ao humano. Vamos antes a uma questão que é, sim, importante: ideologia não faz nem bons nem maus escritores. Já lhes falei aqui sobre o escritor russo Máximo Gorki, que não chegava a ser um gênio, mas um mestre se comparado ao Chico romancista. Era ao menos mediano no seu ofício, mas foi mais bem-sucedido como canalha. “Se o inimigo não se rende, deve ser exterminado“, escreveu este humanista nas páginas do Pravda quando Stálin estava liquidando os kulaks, os camponeses “atrasados”. Simon Sebag Montefiore demonstra em “Stálin, A Corte do Czar Vermelho” — QUE É LEITURA OBRIGATÓRIA A QUALQUER TEMPO, INDICO DE NOVO — que este homem “indissoluvelmente” ligado à cultura “visitou os campos de concentração e admirou seu valor reeducativo; apoiou campos de trabalho escravo como o Canal Belamor, que visitou com Iagoda [NR: um notável bandido da polícia secreta da trupe stalinista]“. Céline era um anti-semita cretino, mas um grande escritor — não nos panfletos asquerosos. A simpatia de Ezra Pound pelo fascismo não o impediu de ser um grande poeta. Maiokowski foi um bom poeta mesmo quando deixou vazar o seu fervor revolucionário. Não chego ao ponto de dizer que pensamento e obra são domínios que jamais se cruzam. Mas, com certeza, são autônomos.

Chico Buarque é um bom prosador? Eis o busílis. Não é! Tornou-se uma figura da“résistance” à ditadura militar, soube administrar muito bem o marketing da contestação, fez-se uma espécie de vitima triunfante do regime militar, compôs a trilha sonora dos que sonhavam com “um outro mundo possível” (sonhos muito justos!) e depois se tornou um propagandista do pertismo. A decadência de sua música coincide com a sua ascensão como escritor. Embora premiadíssimo como literato, algo de espantoso acontece: a fortuna crítica sobre a obra do romancista é quase inexistente. Quando se vai falar do escritor, é sempre o moço de “A Banda”, que reaparece. Ou o de “Apesar de Você”. Ou ainda o de “Cálice”. É também aquele de “Olhos nos Olhos” ou “Atrás da Porta”. Sua incursão no mundo da literatura não é recente. Ainda era um ídolo ativo da MPB  quando escreveu um troço constrangedor chamado “Fazenda Modelo”, uma espécie de “Animal Farm” (A Revolução dos Bichos), de George Orwell, mas com acento de esquerda. Se o escritor inglês fazia a óbvia distopia do comunismo, o sambista decidiu que era preciso fazer a parábola do horror capitalista! Na versão de Chico, a exemplo do quie de fato aconteceu no comunismo, pode-se dizer qa gente pode dizer que os porcos são autênticos… Terei sido muito sutil?

Quando a “Rita levou todo o assunto de Chico”, ele voltou a fazer suas incursões na literatura. E fez um sucesso enorme, e foram poucas as almas corajosas para lhe dizer: “Olhe, rapaz, isso é ruim! Romance é mais do que esse fluxo de consciência vazado na chamada prosa poética”. Impossível! Era o nosso homem da “résistance”, o rapaz de família nobre que lutou por nós — embora não precisasse disso, claro. E ele foi se firmando não diria no silêncio cúmplice, mas na algazarra dos adoradores, embora, insisto, falte a fortuna crítica sobre sua obra. O mais laureado romancista brasileiro da atualidade prospera num gigantesco vácuo crítico.

Não há um filho da mãe de uma acadêmico de peso — pode até ir lá aplaudir o Jabuti que surrupiaram para ele — que nos exponha num ensaio, numa trabalho de fôlego, o “Chico romancista inquestionável”, senhor de uma grande obra, de uma escritura própria, que rompe — ou referenda — a tradição; capaz de, pela linguagem, perscrutar o que antes não havíamos investigado em nós mesmos, no outro, na humanidade ou na natureza; ou, então, hábil na leitura de um tempo, de uma era. Ou, ainda,  capaz de investigar as grandezas e misérias humanas. Nada! Aplaudem ou silenciam, mas jamais dizem por quê. E há uma razão para isso. O que se premia em Chico não é a obra literária, mas a personalidade, a personagem, o mito do “intelectual” (?) recluso, avesso aos holofotes na era das celebridades — o que faz dele, evidentemente, uma celebridade. Tão importante quanto premiar Chico Buarque é saber se ele vai aparecer para receber aquela “humilde homenagem”…

E é isto que distinguem em Chico: o ambiente em que ele produz e em que circula sua obra, não o livro em si. Por isso o Prêmio Jabuti é capaz de considerar que ele fez apenas o segundo melhor romance, mas a melhor “Obra de Ficção”, categoria geral em que está a subcategoria “romance”. Lula argumentaria assim para quem é incapaz de assimilar conceitos: é como se reuníssemos vários chefes de cozinha para escolher a melhor carne, a melhor pasta e a melhor pizza. E haverá o grande prêmio da noite para a melhor comida. O vencedor é o que ficou em segundo lugar na categoria “pizza”. Seria ridículo num evento  para o estômago. É um evento para o estômago numa ridicularia literária.

Corrente de ofensas
A corrente de ofensas depois que publiquei o post sobre a petição é gigantesca? É , sim! Ignorantes (ver post abaixo) rematados, que não saberiam distinguir um livro de uma fatia de presunto, ficam indignados. Acham que estou pegando no pé de Chico Buarque porque ele é de esquerda — como se seu esquerdismo tivesse qualquer importância. Esquerdistas como Chico existem aos montes, até muito mais ricos do que ele próprio. Não “diminoem” nem “contriboem“. O que, aí sim, um desserviço à cultura e à literatura é transformar um prêmio literário numa espécie de desagravo àquele que representaria a consciência crítica da nação. Ora, tenham paciência! Na tal manifestação de intelectuais em favor de Dilma Rousseff, o sambista defendeu o lulo-petismo afirmando que este “não é um governo que fala fino com Washington e grosso com a Bolívia e com o Paraguai”. Trata-se de uma boçalidade militante, mentirosa (FHC comprou mais brigas com os EUA do que Lula, por exemplo) e que tem o condão de endossar protoditaduras na América Latina — não por acaso, é o discurso de uma famoso apoiador da tirania cubana. Compreendo que Chico seja do tipo que lastime, porque lastimo também, as 424 mortes havidas durante o Regime Militar no Brasil. Não entendo por que ele não lastima as 100 mil de Cuba.  O sambista empenha a sua fama na defesa um regime compulsivamente homicida.

O que isso tem a ver com a literatura dele?
“Mas o que isso tem a ver com a literatura dele?”, perguntam alguns indignados. Ora, a minha resposta é justamente esta: NADA! Quem premia o “resistente” são eles. Eu só estou pedindo que distingam os literatos por sua literatura. Porque, se é verdade, e é, COMPROVADAMENTE, que o alinhamento ideológico confere distinções, não é menos verdade que ele também pode definir exclusões.

O prêmio de Melhor Obra de Ficção para Chico Buarque nada teve a ver com a sua literatura. Foi uma homenagem a todo leite militante que ele andou derramando desde que estava à toa na vida. Alguém poderia perguntar: “Mas que importância tem essa questão, Reinaldo?” Olhem, isso é mais relevante do que parece: a principal láurea da literatura brasileira não é decidida segundo critérios literários, mas numa “supracategoria” a que ela estaria subordinado. Não pensem que os critérios de certas distinções acadêmicas ou jornalísticas são muito diferentes.

Se a literatura, a academia e o jornalismo são usados para referendar uma ideologia, é claro que pode chegar o dia em que a ideologia será usada para referendar , ou não, a literatura, a academia e o jornalismo. E aí estaremos vivendo uma forma de ditadura, ainda que festiva.

Queriam que eu falasse a sério sobre a coisa? Falei! Chico, devolve o Jabuti!

Para assinar e divulgar a petição, clique aqui.

By:  Reinaldo Azevedo


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3 comentários: on "“Chico, devolve o Jabuti""

Nanael Soubaim disse...

Eu também: "4773 Signatures Total"

Augusto N Sampaio Angelim disse...

Estou nesta também e até escrevi uma cronicazinha instando o filho de Sérgio Buarque a devolver o prêmio.

http://recantodasletras.uol.com.br/cronicas/2622207

hmoura disse...

Bom que você fale...
Mas também que "ouça" o que aqui comentamos.
Isso é muito bom! Meus cumprimentos!

Em nenhum caso da história do Prêmio Jabuti, nenhum, nem unzinho, ouve contestação à pessoa do autor ou do "autor-pessoa" (como agora muitos estão tratando a premiação do "Leite Derramado"). O negócio é pegar a pessoa Chico Buarque e tentar apagar a história dele (de sucesso) ou garimpar algum deslize dele (como se somente ele cometesse erros na vida). Aposto uma cocada como não vão conseguir desmerecer o sujeito (seja ele a pessoa ou o compositor e escritor)!

É como comentei lá no seu "blog", na Veja... Não foi o Chico quem escolheu o livro dele, foram outros e - parece - com base nas regras (que todos aceitaram e que só agora querem contestar). Por que não fizeram o mesmo em 2004 e em 2008, quando algo igualzinho ocorreu e quando as regras eram as mesmas? Por quê? Repito: não foi o autor quem elegeu o livro dele! Não vejo aqui e em qualquer outro lugar, campanha para contestar os votantes... Como não vi ninguém criticar os eleitores do Tiririca, mas apenas o próprio (que ele é "palhaço", em tom jocoso e que poderia ser analfabeto). Uai, não foi o Tiririca quem o elegeu, foram os eleitores, não foram? Então, se for o caso, cacete nos eleitores... Não no eleito!

Aposto um doce de leite (não derramado) como o "Leite Derramado... E Premiado" vai vender ainda mais e até será lido por quem não leu e está discusando sobre. E Chico passa a ser também grande visionário, pois escolheu ("previamente" e muito bem) o título do livro dele, pois nunca vi tanta choradeira pelo "Leite derramado... E Premiado" (derramado aqui e premiado aqui e em Portugal, por enquanto)!

Ah, também escrevi alguma coisinha para que Chico NÃO devolva o prêmio. Em democracia deve ser assim, não é? O que escrevi está bem aqui:

Devolva, não, Chico... Coisíssima Alguma!

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